O acidente vascular encefálico é uma das principais causas de incapacidade e está tipicamente associado à perda da função motora e redução da capacidade de realizar atividades da vida diária. A estimulação elétrica é recomendada em diretrizes clínicas, mas revisões sistemáticas anteriores não diferenciaram entre diferentes níveis de envolvimento do paciente durante a aplicação da estimulação. Esta revisão teve como objetivo estimar o efeito da estimulação elétrica sem envolvimento ativo (estimulação elétrica neuromuscular) em comparação com nenhuma estimulação elétrica nas atividades da vida diária e habilidade motora funcional em adultos com acidente vascular encefálico.
Um protocolo foi especificado a priori para orientar os métodos. Buscas sensíveis realizadas em cinco bases de dados (incluindo PubMed e PEDro) e busca de citações foram usadas para identificar ensaios controlados aleatorizados publicados em inglês. Os participantes eram adultos com diagnóstico clínico de acidente vascular encefálico com qualquer nível de gravidade da paresia ou de cronicidade. A intervenção foi estimulação elétrica neuromuscular administrada ao membro superior ou inferior através de eletrodos de superfície para provocar uma contração muscular visível, sem envolvimento ativo do paciente, além da reabilitação usual. O comparador era apenas a reabilitação usual. O principal desfecho foi as atividades da vida diária. A habilidade motora funcional foi o desfecho secundário. Dois revisores independentes selecionaram ensaios para inclusão, avaliaram o risco de viés e os dados extraídos. Quaisquer desacordos eram resolvidos por discussões de consenso ou por um terceiro revisor. O risco de viés foi avaliado usando a escala PEDro e a ferramenta Cochrane de risco de viés. A certeza da evidência não foi avaliada. A meta-análise foi usada para reunir os ensaios incluídos para calcular diferenças médias padronizadas e intervalos de confiança de 95% (IC). Foram especificadas três análises de subgrupos: localização da estimulação (membro superior vs. membro inferior); tempo pós-acidente (agudo vs. subagudo vs. crônico); e, gravidade da paresia (leve vs. moderado vs. grave).
20 ensaios (956 participantes) foram incluídos nas meta-análises. Os participantes tinham idade média de 62 anos e predominantemente homens (54%). A localização da estimulação foi o membro superior em 13 ensaios (primeiramente abdutores de ombros, extensores de pulso) e em 7 ensaios o membro inferior (principalmente dorsiflexores de tornozelo). O tempo pós-acidente vascular encefálico foi agudo (< 7 dias) em 3 ensaios, subagudo (7 dias a 6 meses) em 13 ensaios e crônico (> 6 meses) em 4 ensaios. A severidade da paresia foi moderada em 5 ensaios e severa em 6 ensaios, sem ensaios investigando participantes com paresia leve, 5 ensaios tendo uma variedade de severidades e 4 ensaios não relatando severidade. A intervenção foi aplicada entre 10-60 minutos/sessão, 1-4 sessões/dia e 3-7 dias/semana durante 3-12 semanas. A estimulação cíclica foi tipicamente usada (freqüência 30 Hz, largura de pulso fixa de 200-300 microssegundos) com a amplitude ajustada para alcançar uma contração muscular visível ou movimento articular. 13 ensaios pontuaram 6/10 ou mais na escala PEDro.
Em comparação com o controle, os participantes dos grupos de estimulação elétrica neuromuscular tiveram uma média de 0,41 desvios padrão na melhora das atividades de vida diária ( IC 95% 0,14 a 0,67; 10 ensaios; 428 participantes) no acompanhamento. Isto se traduz em uma média de 9 pontos a mais na versão 0-100 do Índice Barthel ( IC 95% 3 a 15), a escala mais usada para mensurar as atividades da vida diária na revisão, para estimulação elétrica neuromuscular em comparação com o controle. [Nota: o desvio padrão de base para o Índice Barthel de um estudo de coorte inicial e orientação do Manual Cochrane v6.1 foram usados para calcular esta estimativa]. Em comparação com o controle, a pontuação média da habilidade motora funcional foi 0,15 desvios padrão maior nos grupos de estimulação elétrica ( IC 95% -0,13 a 0,43; 13 ensaios; 659 participantes). Como o IC 95% para esta estimativa inclui zero, a intervenção pode não ter efeito para este desfecho secundário.
As análises dos subgrupos revelaram que os efeitos para as atividades da vida diária foram ligeiramente maiores para o membro superior (diferença média padronizada 0,34, IC 95% 0,04 a 0,64; 6 ensaios; 266 participantes) comparado com o membro inferior (diferença média padronizada 0,49, IC 95% -0,04 a 1,03; 4 ensaios; 162 participantes). Os efeitos também foram ligeiramente maiores no acidente vascular encefálico subagudo (diferença média padronizada de 0,44, IC 95% 0,10 a 0,78; 7 ensaios; 310 participantes) do que no acidente vascular encefálico crônico (diferença média padronizada de 0,35, IC 95% -0,14 a 0,84; 3 ensaios; 118 participantes), e não houve ensaios para este resultado no acidente vascular encefálico agudo. A paresia severa (diferença média padronizada 0,36, IC 95% -0,55 a 1,26; 3 ensaios; 142 participantes) e a paresia moderada (diferença média padronizada 0,21, IC 95% -0,16 a 0,58; 3 ensaios; 119) tiveram efeitos similares, não havendo dados disponíveis para a paresia leve.
A estimulação elétrica neuromuscular com reabilitação usual proporcionou melhora das atividades da vida diária após o acidente vascular encefálico, mais do que somente a reabilitação usual. Isto foi particularmente evidente para o membro superior e pacientes subagudos. A estimulação elétrica neuromuscular teve pouco impacto sobre a habilidade motora funcional.
Kristensen MGH et al. Neuromuscular electrical stimulation improves activities of daily living post stroke: a systematic review and meta-analysis. Arch Rehabil Res Clin Transl 2022;4:100167